segunda-feira, 12 de junho de 2017

Revolução eleitoral

1. Ultrapassando as previsões mais favoráveis, a vitória do novel partido do Presidente Macron nas eleições legislativas em França alcança a dimensão de um verdadeiro tsunami político.
Tendo em conta as projeções para a segunda volta, no próximo domingo, o partido do Presidente pode ultrapassar os 400 deputados (em 577), uma maioria superior a 2/3, a segunda maior da V República (desde 1958)! Esta impressionante vitória do République En Marche (REM) é feita à custa de todos os outros partidos, alguns dos quais descem muito em relação às eleições presidenciais (1ª volta), nomeadamente a extrema-direita de Le Pen e a extrema-esquerda de Mélenchon. A direita tradicional e o PS fazem dos piores resultados eleitorais de sempre. O PS, que tinha maioria no parlamento cessante, não passa agora de uns humilhantes 10%, bem abaixo da esquerda radical!
Trata-se de uma verdadeira revolução no sistema partidário da V República, até agora marcado pela bipolarização entre a direita republicana e a esquerda socialista, agora maciçamente desamparadas pelos eleitores. Chegou a vez do centrismo liberal?

2. Os resultados eleitorais revelam mais uma vez as enormes distorções entre a proporção de votos de cada partido e os mandatos parlamentares conseguidos, em favor do partido vencedor, provocadas pelo sistema eleitoral maioritário a duas voltas.
De facto, a esmagadora maioria parlamentar do REM é conseguida com apenas 32% dos votos na primeira volta, que espelha as primeiras preferências dos eleitores. E mesmo que na segunda volta a percentagem do partido vencedor seja naturalmente mais elevada, ela ficará sempre muito aquém da sua percentagem de assentos no parlamento. Em contrapartida, todos os demais partidos, especialmente os partidos dos extremos, à esquerda e à direita, terão uma percentagem de mandatos muito abaixo da sua quota de votos.
Resta saber se Macron vai respeitar o seu compromisso político de introduzir uma dimensão de proporcionalidade no sistema eleitoral, criando um sistema misto, de modo a reduzir estas enormes discrepâncias, que põem em causa a própria equidade mínima da representação política.

Adenda
O Le Monde simula os resultados com um sistema proporcional, num único círculo eleitoral nacional, onde o REM teria somente 186 deputados (menos de metade dos que vai ter). Mas a simulação é enganadora, visto que a generalidade dos países com sistema proporcional usa círculos eleitorais territoriais (como sucede em Portugal) e uma cláusula-barreira (como sucede na Alemanha), desse modo favorecendo o partido mais votado.